sábado, 3 de outubro de 2009

Sentidos

"Naquela balada morena que me perseguia pelas ruas, não me apercebi da sombra que se deslocava atrás de mim, leve como ar mas ao mesmo tempo tão real como a parede de tijolo pela qual passava as minhas mãos pequenas mas longas e hábeis. Cada passo era a constatação da sua presença - uma presença que me parecia invisível dada a minha concentração no teu jeito de ser, de me envolver. Os segundos traduziam-se numa coreografia sem regras na qual a liberdade era o ritmo que me guiava. Sem justificações e sem ter que recorrer a um compasso insonoro que era apenas audível para mim.

Ainda assim consiga senti-la, aquela pressão que já antes tinha sentido, como se alguém se estendesse por cima do meu corpo e eu não conseguisse respirar, só ofegar, procurando o ar que não me era destinado. Perdia os sentidos há medida que me movia e pela primeira vez aprendi a abraçar essa sensação em vez de a repelir.

E assim, num movimento digno de beija-flor, toquei-lhe suavemente. O calor que percorreu nada centímetro da minha pele não era o esperado e mais uma vez me sentia desfalecer apesar da sensação ser idêntica à de tomar um banho em que a água ferve mas ainda assim nos queremos manter lá dentro.
Não podia o podia largar. Deixei-me levar ao som de uma música que era apenas audível para ele, para mim, para nós, numa noite em que o céu chorava e ainda assim havia estrelas sorrindo."